- A porta abriu-se silenciosamente e o homem musculoso passou por ela, fechando-a atrás de si, não precisaria voltar para ir embora. Sentia-se nervoso por causa do grande corredor sem portas que se deparou com apenas uma porta no fim dele. Parecia feito especialmente para uma armadilha. Caminhou o mais rapidamente que pode sem fazer barulho, incomodando-se com as cores brancas demais no lugar – orfanatos eram onde crianças ficavam, não? Então por que tudo parecia tão impecável? Como se ele houvesse acabado de entrar em uma área de quarentena em algum hospital. Aquilo lhe deu um arrepio. Vivera ali por dois anos de sua vida. Deu mais um passo até a porta e percebeu que esta se encontrava apenas encostada, empurrou-a de leve esperando que não fizesse barulho como a anterior.
Errou. O ranger de ferro enferrujado contra outro ferro foi alto o suficiente para despertar quem quer que estivesse ali dentro. Uma porta foi aberta mais para frente e Theodor não teve tempo nem de prestar atenção no ambiente, por que aquele segurança vinha correndo em sua direção, suas feições dizendo ao eslovaco que ele não iria parar para conversar. O homem fechou as duas mãos em punhos, deixando-as cair ao lado do corpo e esperou o brutamontes se aproximar, uma voz em sua consciência se perguntando o porquê de um cara tão mau encarado estar num orfanato. O moreno com aparência de mais velho que Theodor se aproximou e tentou-lhe atacar com o cassetete, mas o guarda-caça desviou-se com facilidade, inclinando-se para frente, jogando sua cabeça no estômago do oponente e empurrando-o na parede, o impacto lhe causando uma aguda pontada. Com o braço direito sobre a jugular do homem, imobilizou-o, fazendo-o desmaiar.
Silencioso. Arrastou-o para o corredor onde se encontrava anteriormente e selou a porta com feitiço, atrás de si. Foi então que teve a chance de prestar a atenção no lugar que encontrara. O corredor era longo como o anterior, mas ao contrário daquele, este tinha portas e janelas com vidros. As portas eram de ferro. Dentro de cada quarto, se assim podia ser chamada aquelas jaulas, uma criança olhava para Theodor. Crianças como aquele garotinho translúcido que lhe dera a senha. Começou a correr pelo corredor, sentindo-se angustiado por ver que os quartos pareciam nunca acabar, até que se deparou com uma porta fechada, alguns bipes parecendo vir de aparelhos médicos. Parou de correr, olhando para a porta por alguns segundos, pensando se deveria seguir por aquele caminho ou prosseguir pelo corredor, em busca da mulher que abrira a porta. O aperto no coração que já era familiar lhe fez girar a maçaneta.
Não se importou dessa vez com o barulho que a porta fazia ao ser empurrada em direção à parede, a cena que visualizou talvez o assombrasse em seus sonhos por alguns meses, talvez anos. A sala, ou melhor, salão, era gigante e Theodor nunca acreditaria que um orfanato seria gigantesco daquela maneira, o ambiente quase se assemelhando ao do Salão Principal de Hogwarts não fosse pelas janelas de vidro espelhadas que iam do teto ao chão, mostrando a avenida, alguns carros parados no sinal vermelho. O chocante daquele recinto estava ligado aos muitos aparelhos médicos, talvez tivessem quantas macas naquela sala? Num raciocínio rápido o eslovaco musculoso conseguiu contar no mínimo umas cinquenta. Sobre elas, jaziam deitadas jovens de todas as etnias, no que ele acreditou ser coma. Coma induzido talvez?
A maioria das jovens ligadas ás aparelhagens hospitalares tinham barriga de gravidez em diversos estágios. O guarda-caça sentiu o coração descompassar e decidiu que precisava sair dali o mais rápido possível, uma verdade obscura adentrando o seu ser mesmo que ele tentasse de tudo para desviar os pensamentos. Será que sua mãe fora uma dessas mulheres? Onde ela se encontrava agora? Aliás, quem eram todas essas jovens em coma e curiosamente grávidas? Não eram para estar em um hospital? Era mais do que óbvio que o que faziam naquele orfanato. Irônico era o nome daquele lugar: Mãos de Deus. Tentou controlar as lágrimas de saírem, mas parecia ser impossível e quando retirou o celular de dentro de um dos bolsos do casaco de frio, sabia que estava prestes a mudar a vida de muitas pessoas. O barulho de murros na porta que selara magicamente estava mais forte e sabia que era questão de minutos para que ela fosse ao chão.
Era engraçado. Havia chegado em Kosice para descobrir seu passado, mas mais do que isso, talvez encontrara uma maneira de salvar aquele menininho que agora sorria para ele perto da janela. Acenou para Theodor por alguns segundos antes de desaparecer gradualmente, o coração do homem mais velho transformando-se em mel por momentos. Discou o número da polícia eslovaca e colocou o celular no ouvido direito. – Tenho uma denúncia de sequestro para fazer. – O eslovaco começou a falar o jeito de entrar naquele lugar macabro, a senha, e quando finalizou a ligação, jogou o celular no chão e pisou em cima dele, retirando o chip e a bateria, guardando-as no bolso da calça. Antes de ir embora, iria até onde guardavam os registros, se é que guardavam. Depois aparataria dali.