Morgaine abriu cuidadosamente os botões das costas do vestido e olhou-se no espelho. Seus olhos se encheram de lágrimas. Pela abertura, via-se a pele branca de suas costas riscada por vergões finos, vermelhos, inchados, e os hematomas roxos que começavam a se formar. Tinha sido punida. Outra vez.
Trancou a porta do quarto e foi, cambaleando, sentar-se no chão. Quase tropeçou no longo e largo vestido branco de lã, de gola alta e mangas compridas, que era obrigada a usar. Sentou-se no chão do quartinho, chorando e rangendo os dentes, cerrando os punhos com tanta força que as unhas começaram a cortar as palmas das mãos. Ao longe, ouviu alguém rezando alto. Era sua avó.
A mesma que a surrara alguns minutos antes com tanta violência a ponto de fazer sangrar as costas da neta. O pequeno coração de Morgaine se contraiu em espasmos de ódio profundo. Como ela podia ser tão nojenta, monstruosa e hipócrita?
Morgaine tinha apanhado outra vez pelo mesmo motivo de sempre, mas hoje tinha sido pior.
Estavam na igreja, rezando, de manhã. Enquanto a avó rezava, Morgaine observava a belíssima arquitetura da Catedral. Estava tão encantada que não notou que sua avó a observava. E nem que, sem perceber, tinha feito a toalha e os objetos do altar ficarem flutuando no ar.
- Não tem vergonha? Praticar artes diabólicas dentro da igreja? DENTRO DA IGREJA?! Não cansa de deixar o demônio te possuir, criatura maligna? Quer ser como seus pais, aqueles adoradores do Diabo? - gritava sua avó enquanto a surrava, depois da magia involuntária de Morgaine.
A avó de Morgaine, Lucy Brönte, era uma fanática religiosa que acreditava que toda magia era obra do Diabo. Desde criança pensava assim, mas a situação piorou quando sua única filha, Amélie, descobrira que era uma bruxa nascida trouxa. Amélie sofreu muito nas mãos da mãe viúva, mas conseguiu ir para Hogwarts. Quando Amélie se casou com um bruxo sangue puro, Gwydion Lovett, Lucy renegou a filha.
Porém, alguns anos mais tarde, Amélie e Gwydion morreram em circunstâncias misteriosas, e a avó fanática descobriu que tinha uma neta de apenas três anos: Morgaine.
Decidiu criar a neta reprimindo todo indício de magia que houvesse nela. Tentou mudar seu nome pagão para Mary, sem sucesso, assim como não conseguia impedir o sangue mágico da garota de se manifestar.
Quando Morgaine fez seis anos, Lucy a colocou na escola do reformatório, um lugar horrível que considerava o único apropriado para sua neta diabólica. A experiência foi devastadora para a menina. As outras crianças a perseguiam, o que fez Morgaine viver praticamente só na biblioteca. Aos dez anos, tinha lido todos os livros de lá, e passou para as públicas de Londres, o que a avó odiava. Além de sofrer bullying duplo por sua magia e pela relligião imposta pela avó, Morgaine sofreu um trauma tão horrendo que a mudou para sempre, nas mãos do horrível professor de Filosofia, um velho estranho e assustador chamado Mr. Simmons.
Depois disso tudo, a pobre garota de apenas 11 anos parecia ter muito mais. Quieta, calada, não gostava de brincar. Ficava sozinha o tempo todo, lendo. Era brilhante e inteligente, sendo a melhor aluna da escola. Se tornou reclusa e triste, e depois de sofrer tanto, passou a odiar todas as pessoas, em especial os homens. Logo começou a pensar em assassinato e suicídio, com a mente totalmente degenerada.
Estava pensando nisso quando ouviu uma batida na janela, naquela noite terrível. Levantou-se, e mal pôde acreditar: Era uma coruja.
No outro dia, apareceu arrumada e com suas coisas numa mala e comunicou á avó que ia para Hogwarts. A avó impediu. Resolutamente, a neta decidiu ir para a porta. A avó pegou uma faca e tentou matá-la, mas ela apenas trancou a porta com magia, e do lado de fora, explodiu todos os objetos de vidro e louça da casa com o pensamento, cheio de raiva e ódio.
No portão, ouviu a avó gritando e os cacos caindo no chão. Nem se virou. Saiu para a rua. Tinha que ir ao Beco Diagonal, e depois, á Plataforma. Tinha muito o que fazer.
Afinal, agora que era uma bruxa, poderia reiniciar sua vida.
Á sua maneira.
[Ojesed] - Maior Sonho: Encontrar algo ou alguém que faça viver valer a pena. Encontrar alguém que me compreenda, e descobrir o que aconteceu com os meus pais.
[Bicho Papão] - Maior Medo: Mr. Simmons, um professor baixo, gordo, calvo e com expressão lasciva.
[Dementador] - Memória: As surras que a minha avó me dava por usar magia, o incidente com Mr. Simmons e a morte dos meus pais.
[Testrálios] - Viu a Morte?: Sim.
[Tattoo] - Marcas corporais: Cicatrizes brancas e leves nas costas e uma pequena cicatriz próximo da orelha direita, na face.