Carlos Attílio Campagnaro Carrasco nasceu para ser mais um gaúcho. Criar gado deveria ser sua meta de vida. E não foi nada difícil começar. Paco Campagnaro possuía um pequeno mas notável rebanho de Angus-Hereford. E para o jovem Carlos, aqueles enormes animais de pelagem vermelha eram fascinantes. Acordar ainda no escuro, vestir toda a indumentária gaúcha e sair no frio para lidar com os bovinos poderia parecer frustrante, estafante, mas o gosto pela coisa estava no sangue. Ferruccio, Nahuel, Nestor, Victorino, Oscar, Facundo, Agustín, Paco e agora ele. As primeiras histórias que aprendeu foram sobre a chegada de Ferruccio Campagnaro nas planícies do rio Uruguai, um aventureiro do sul da Itália que veio para o Novo Mundo atrás de oportunidades. Encontrou indígenas, planícies e um pouco de gado. Começou como peão raso, casou-se com uma indígena charrua e teve seu primeiro filho, Nahuel. Que também criou gado e comprou a primeira fazenda da família. E a passou para seu sucessor. Que fez o mesmo, até que depois de 2 séculos chegasse a Carlos.
Mas Carlos era diferente. Óbvio que ele tinha talento para a lida de gado. Gostava do cheiro de terra molhada, de andar a cavalo. Ordenhava como poucos. Mas possuía algo mais. Era bruxo também. E embora viver para sempre ali não fosse nenhum esforço, seu talento lhe impulsionava a conhecer o mundo. Ao atingir a idade mínima para entrar em Castelobruxo, no Brasil, sua mãe o mandou para lá. Paco ficou muito desgostoso da mulher. Achava que o menino não ia voltar e que sua linhagem estaria fadada ao fracasso. Que ele, Francisco, seria o último dos gaúchos. O mundo dá voltas, no entanto.
O que Carlos conheceu na escola de magia o fascinou. As criaturas mágicas, as plantas mágicas, os truques. Unicórnios, fadas, dragões, cocatrices, hipogrifos, trolls. E logo ele que se achava muito próximo dos animais, de ovelhas, bois, galinhas e outras aves. Que sabia manusear a boleadeira e a funda e fazer tantas outras acrobacias com facas.
Após concluir os estudos, aprofundou seus estudos na área de magizoologia. Se os rebanhos que tratava eram interessantes, o que dizer das criaturas mágicas? Ao concluir esta etapa, fez um estágio em sua antiga escola e assumiu o posto de guarda-caça de Castelobruxo. Ficou na função por 10 anos, até os 35. Tratava de pégasos, dedo-duros, até mesmo tornou-se 'amigo' dos caiporas que populavam os arredores da escola. Igualmente, gostava de assustar os alunos mais novos falando sobre os clabertos e como eram perigosos, ainda que de fato fossem inofensivos. E sugeriam que se quisessem ter sorte, que carregassem a todos os momentos pepinos consigo. Afinal nunca se sabe quando um Kappa irá aparecer.
Quando soube do falecimento de seu pai, não fazia ideia de quanto tempo havia ficado longe de Paysandú. Ao retornar ao lar, a pedido da mãe, passou a tomar conta da fazenda. Não era a mesma excitação de cuidar das criaturas da escola, mas ficar no rancho estava longe de ser ruim. E com as facilidades que a magia trazia para a jornada com o gado, a simplicidade definia. Nesse período de convivência mais próxima de Rosa, uma cozinheira de mão cheia, desenvolveu o gosto pela charcutaria, processo que envolve a salgar, defumar, conservar e preparar embutidos de carne. Com matéria-prima abundante no rancho, conseguiu apurar suas habilidades culinárias.
A estas alturas, Carlos estava resignado a cuidar da fazenda. Finalmente cumpriria sua sina de gaúcho. Eis que a vida ainda lhe faz mais uma pequena reviravolta. Um grande criador de gado na Argentina, velho conhecido do bruxo, faz um pedido algo inusitado: pede que vá cuidar de seus rebanhos na Europa. Com os filhos formados e largando o negócio da família, não havia mais ninguém em quem confiasse para criar seus animais, exceto o bom e velho Carlos, que nunca foi de rejeitar desafios.