Nascido em família tradicional, em berço de ouro, sem ter que se preocupar com nada. Quem olha para Johann pode ter essa impressão. Quando se visita o chalé suntuoso que os von Blumenthal possuem no leste da Áustria, a tranquilidade e o charme encantam. A maior preocupação é cuidar das simpáticas vaquinhas tirolesas. Quem observa de longe, pode acreditar que não há momento para estresse, e que ali é o melhor lugar do mundo. Poderia ser assim. Poderia.

Desde muito cedo, Karl von Blumenthal deixou claro para seus filhos que eles viviam e dormiam com tanta tranquilidade porque homens antigos e brutos praticaram bastante violência para que a paz fosse assegurada. A harmonia e o sossego de qualquer lugar é fruto apenas de quanta violência fora praticada em seu nome. E com a relação histórica que eles tinham com conflitos e guerras, todo von Blumenthal sabia disso.

De forte tradição militar, os antepassados de Johann e sua irmã, Franziska, lutaram incontáveis batalhas, obtiveram glórias e fizeram o nome deles ser respeitado por toda Europa. Mas desde a virada do séc. XX, a luta mudou. De origem essencialmente prussiana, a família viu-se obrigada a fugir e correr pela Europa desde a ascensão do fascismo, com os bisavós de Karl fugindo da Prússia durante após a dissolução do país e eventual anexação pela Polônia, fugindo da Alemanha nazista em seguida, refugiando-se na Suíça e depois estabelecendo moradia na Áustria.

Karl ensinou que sempre deveriam lutar, que a vida era uma contínua peleja. Contra as mazelas do mundo, mas também contra a própria perversidade e tudo de ruim que poderia surgir dentro de si. Por muito tempo acreditou que a disciplina militar auxiliava nos dois objetivos. A força das armas poderia trazer o bem ao mundo e a disciplina marcial permitia ao sujeito controlar suas emoções mais negativas.

Mas o tempo permitiu ver a questão com outros olhos. A liberdade era a chave. Todos os bruxos da família estudavam em Durmstrang, inevitavelmente. Era uma das tradições mais antigas dos von Blumenthal. Mas ele daria a liberdade de escolha aos filhos. Apesar da opção, Franziska não hesitou. Ela era uma guerreira, uma alma beligerante. Mas Johann era diferente. Muito embora gostasse do aspecto marcial e respeitasse a história de seus ancestrais, faria questão de exercer sua liberdade. Sua tia Klara, uma libertária irrefreável, havia-lhe incutido esse gosto pelas próprias escolhas. E ele acreditava que podia tornar-se o seu melhor sem estar confinado num ambiente árido como Durmstrang.